Na opinião de José Meco, os painéis das paredes da nave, onde se inclui esta cena do martírio de S. Lourenço, não são da autoria de Policarpo de Oliveira Bernardes. Atribui-os a um colaborador individualizado do ciclo joanino que trabalhou segundo o programa decorativo daquele mestre.
Atendendo a que o contrato notarial foi realizado no dia 16 de Novembro de 1729 e determinava que os azulejos estivessem todos assentes na Primavera seguinte de 1730, parece evidente que os irmãos Manuel e Antão Borges, profundos conhecedores do meio artístico lisboeta, adquiriram a maior parte a Policarpo de Oliveira Bernardes e a restante a outra oficina de azulejaria, eventualmente próxima daquele pintor.
Nos princípios do século XVIII a pequenina ermida tardo-medieval de S. Lourenço encontrava-se quase arruinada, já sem portas.
No dia 22 de Setembro de 1722 os moradores deste lugar encontravam-se desesperados com falta de água e quando afundavam um poço, imploraram o patrocínio do Santo, prometendo construir um novo templo. Talvez "por destino do Santo", receberam um tão grande benefício que de imediato " abriu um anel de água tão copiosa ".
A partir de então a confraria de S. Lourenço dos Matos cresceu de importância, passando a ter como Juiz Protector uma das mais altas individualidades da região algarvia, o Dr. Manuel de Sousa Teixeira, Vigário Geral do Bispado.
Com as esmolas dos fiéis começou-se a construir "um primoroso templo, não pela grandesa, mas pelo ornato, asseio e magnificência", destacando-se a utilização de valores da arquitectura vernacular compensados interiormente por uma exuberante ornamentação.
Os dois irmãos Borges, naturais de Lisboa, o Antão, mestre pedreiro, morador em Faro e o Manuel, mestre de azulejo, residente em Lisboa, devem ter assumido a construção da igreja, já com o objectivo de a revestirem de azulejaria. Estes dois artistas foram responsáveis no Algarve por diversas obras, de que se destacam em Faro, o revestimento azulejar da Igreja da Ordem 3ª de S. Francisco e a construção do coro alto da Sé.
Em Novembro de 1729 estes mestres comprometeram-se com o já referido Dr. Manuel de Sousa Teixeira a arranjar os azulejos para o novo templo e a assentá-los com a maior brevidade.
O retábulo e a restante talha deve ter sido concebida e executada, por volta de 1735, pelo melhor artista da região, o mestre Manuel Martins.
O douramento foi somente contratado, no dia 16 de Fevereiro de 1742, pelos pintores algarvios Clemente Velho de Sarre e Francisco Correia.
O terramoto de 1755 quase não se fez sentir, tendo somente caído cinco azulejos do alto da abóbada.
Em 1849 foi suprimida a freguesia de S. João Batista da Venda e criada a de Almancil. A sede da paróquia foi então transferida para a Igreja de S. Lourenço, com a designação de S. João Batista de Almancil.
Nas paredes laterais deste templo há oito painéis figurativos alusivos à vida de S. Lourenço. Os dois da ousia representam o Santo a distribuir pelos pobres os bens que a Igreja lhe confiava para este fim e um milagre feito junto ao rio Tibre, em que restitui a vista a dois cegos.
Os seis painéis da nave da igreja apresentam-se por ordem cronológica, com início no lado da epístola, junto à capela-mor e prolongam-se no lado do evangelho a partir da porta.
1º - S. Lourenço dialoga com o Papa Sisto, quando este ia ser martirizado, lamentando-se de não ir com ele. O Pontífice anima-o dizendo que três dias depois seria a sua vez.
2º - O Santo é preso e acusado de possuir grandes riquezas, tratando-se contudo das esmolas que o Papa Sisto lhe mandava distribuir pelos pobres.
3º - S. Lourenço apresenta ao imperador romano, Valeriano, os tesouros da Igreja, isto é, os pobres.
4º - O Santo é intimidado a renegar a fé em Cristo e a aceitar os deuses romanos.
5º - S. Lourenço é colocado sobre uma grelha para ser queimado a fogo lento a fim de ser maior o seu suplício, esperando que ceda perante a dor.
6º - O Santo é confortado no seu martírio por um anjo de Deus, que leva a sua alma ao céu.
Os fiéis, nos meados do século XVIII, afluíam em maior quantidade à ermida de S. Lourenço na antevéspera e na véspera do dia de festa do Santo (10 de Agosto). Mais de duas ou três mil pessoas deslocavam-se em romagem "não só pela devoção de verem a S. Lourenço, como pela grandesa da sua festividade e fogo que arde na noite do Santo e além disto pelos muitos bailes e descantes da gente que ali acode".
Num livro manuscrito com as músicas e letras dos hinos religiosos então cantados em louvor do padroeiro; destaca-se a iluminura do Santo a subir aos céus com vários anjinhos. É provável ter sido realizada no 2º quartel do século XVIII por um artista farense, talvez Clemente Velho de Sarre.
Os azulejos da abóbada da nave e da capela-mor, incluindo a cúpula, foram feitos, em 1730, por Policarpo de Oliveira Bernardes. No entanto, o contrato notarial foi celebrado entre o Juiz da Confraria e os irmãos Manuel e Antão Boges, comprometendo-se estes últimos "a darem por sua conta todo o azulejo necessário para se azulejar a capela do Santo, tanto paredes como a meia laranja e assentar o dito azulejo (...) com toda a perfeição possível (...) e da melhor pintura que poder ser".
É de realçar nesta cena da coroação de S. Lourenço, tema do painel central da abóbada da nave, uma técnica bem característica de Policarpo em que as "sombras e marcas mais carregadas de azul são obtidas através do cruzamento perceptível de pinceladas distintas" (José Meco).
A decoração da sacristia fez também parte da remodelação realizada neste templo no 2° quartel do século XVIII. As paredes foram revestidas com um grande rodapé de azulejos com motivos ornamentais barrocos: folhagem de acanto, albarradas, etc..
Na parte central foi colocado o mais interessante arcaz barroco de toda a região algarvia, sobressaindo a ornamentação em talha das portas, dos gavetões e do espaldar. Este último abrigava a imagem procissional do padroeiro.
Tal como a talha da igreja, o arcaz e a imagem procissional de S. Lourenço devem ter sido feitos pelo mestre entalhador e escultor farense Manuel Martins.