“«A Eduardo Lourenço devemos a lição de interrogar não só a vida, mas também a morte com sabedoria, distanciamento e serenidade, lutando para conter a história nos limites do humanamente aceitável, tarefa como sabemos trabalhosa e inacabada, mas também indeclinável se quisermos que a civilização e o humanismo sejam mais do que uma abstração.»
José Tolentino Mendonça
«Antologiar um autor tão diverso e multifacetado é tarefa complexa, mas apaixonante. Os textos e as ideias encadeiam‑se – numa procura permanente de posição e de sentido. O labirinto que o ensaísta percorre traz‑nos a saudade não como melancolia ou como lembrança e desejo, mas como interrogação e dúvida, paradoxo e demanda de síntese. A paixão por Camões, Antero e Pessoa significa a procura de compreender a cultura como um diálogo permanente entre o sublime e a vida comum, a unidade e a diversidade...»
Guilherme d’Oliveira Martins
Antologia dos principais textos de uns dos mais marcantes pensadores da cultura portuguesa do século XX falecido no final de 2020. Selecção das principais questões e autores sobres os quais Eduardo Lourenço reflectiu feita por Guilherme d’Oliveira Martins, um profundo conhecedor da obra do ensaísta e um dos seus amigos mais próximos.
«Os textos que constituem a presente escolha procuram abranger momentos importantes do percurso do autor, começando pela definição da atitude independente e heterodoxa e pela referência fundadora da relação com a Europa e com o diálogo que então nos faltava (1949), colocando essa reflexão na continuidade de quantos portugueses recusaram fechar‑se dentro das fronteiras, desde os renascentistas aos românticos, como Garrett e Herculano, até à complexa atitude de Antero de Quental e da sua geração, de quem se sentiu tão próximo sempre.
E nesta linha repensa Portugal (num contexto existencial), interpreta a conferência de Antero sobre as «Causas da Decadência», interroga Oliveira Martins, analisa criticamente o papel dos mitos, desconstrói a saudade e o sebastianismo, encontra‑‑se com Camões enquanto referência cultural, e mergulha numa reflexão sobre Fernando Pessoa. A existência mítica e os caminhos vários que abre foram uma preocupação permanente do ensaísta, em busca da diversidade, da porta aberta, do melting pot português, das aventuras e desventuras migrantes, do País entre a realidade e o sonho, da língua projectada universalmente. Mas o sentido crítico, sempre muito agudo, levaria à reflexão sobre a Europa desencantada.
E, por fim, nesta recolha é ainda possível encontrar a relação pessoalíssima do ensaísta com a poesia. Hölderlin diria «o que permanece / os poetas o fundam». A amizade com Carlos de Oliveira obriga a explicações sobre «o sentido e a forma da poesia neorrealista», a crítica e a metacrítica aprofundam a atitude criadora do autor, Camões é símbolo da nossa cultura e Antero revela a tensão essencial (bem presente neste ensaísmo) entre o pensamento e a utopia.
Eduardo Prado Coelho falou de uma nostalgia da unidade e do absoluto em Eduardo Lourenço. Num texto inédito de 1954, publicado pela revista Relâmpago (n.o 22, 4 ‑2008) («Ísis ou a Inteligência»), o ensaísta diz: «a mitologia é a verdade dispersa, túnica rasgada de um deus morto a quem só podemos ressuscitar juntando com paciência piedosa todos os pedaços. Essa tarefa é superior às nossas forças». É essa interrogação permanente sobre os mitos que nos revela uma das facetas mais originais do autor. Se bem virmos, é a desconstrução de mitos, como a saudade e o sebastianismo, ou como os excessos contraditórios sobre a nossa identidade, que permite avançar no sentido de uma ideia de emancipação individual ou colectiva.»”
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